11/01/12

Labirinto dos sonhos



Caminhava num estreito e degradado corredor
sumida nos sons de um silêncio profundo, abstracto.
Para trás, ficavam seres estranhos
com seus olhos carregados num misto de dor, ódio,
desconfiança e espanto.


Caminhava apressada como que instruída
pelo apelo da derradeira porta.


Na sua pressa quase esbarrou com três homens furibundos
sustendo no ar uma frágil e pequena cadeira de pinho
ocupada por uma criança com uma corda grossa no pescoço.
Atónita, alarmada, olhou para cima.
A meio metro da cabeça, a ponta erecta estava cortada.


Entrou no quarto dos fundos onde uma mulher desvairada
acusava, com gestos, o menino da cadeira por todo o mal sucedido.


Que mal? Porquê tanta demência se nem um som se ouvia?
Olhou ao seu redor tentando entender o que apenas sentia.


Naquele quarto pequeno, onde o caos se tinha instalado,
avistou mais duas crianças imóveis, subnutridas:

uma num canto em novelo encolhida,

outra numa enxerga e virada para a parede.
Devagarinho, rodou-a.
O seu mundo era outro.

Aquele das coisas mais simples e belas
onde a mobilidade cerebral a ciência ainda não conserta.

Mais tarde veio a saber que, a menina da enxerga,
abandonada num destroço qualquer, não pertencia à família.

Ainda hoje estremece à peculiaridade isócrona do sonho.



(escrito em 22/01/2010)